15 outubro 2009

O amor truculento

Ela havia sido feita predestinada ao amor, no entanto, fugia. Sofria calada e amava o nada, pelo menos por enquanto, depois de tudo que passou. Queria por tudo proteger o amor que julgava precioso. Tinha medo que o machucassem, que o destruíssem, tinha medo que ele se tornasse gasto. Mal sabia ela que o amor se reconstitui como o rabo da lagartixa, que é indestrutível, e que é o único sentimento que quanto mais se gasta, mais cresce.
Por mais que ficasse a deriva da dor que o amor traz, teria visto também, sua beleza e sentido sua essência, mas ela se deixou levar pelo medo da dor, sem saber que amando ou não amando, sofreria, de novo.

Não conseguia olhar para si e não ver apenas um pedaço de nada. Um nada que sentia tanto por ver tudo se perdendo. Descobriu que não podia esperar nada dos sentimentos. Podia apenas deixá-los vir, sem culpa, e o resto eles fariam. Chegou ao seu limite alcançável, experimentou das piores sensações e se reconheceu. Afinal, um ser humano só se reconhece quando chega ao seu extremo de novo, e isso exige de toda a sua coragem, toda a sua força.

O vazio dos olhos negros. Era isso o que via, o que os outros viam. O vazio.
Se alimentava de meros novos tentadores de amor, mas eles não lhe davam o sustento, a sensação real do significado do amor, do respeito e sentimento. Sentia que precisava de mais. O chão se abria sobre seus pés, e o vazio continuava a perseguindo.

Queria que não fosse embora nunca, mas queria abandonar tudo e ir pra longe. Fingir que a vida ainda não houvesse lhe dado a chance. Fingir que por tantas e tantas vezes essa chance não havia batido na porta com cara de amor. Mas preferia o sofrimento, preferia a dor, não por gostar, mas sim por simplesmente ter. Não trocaria uma coisa que sabia fazer tão bem, por outra completamente incógnita. Não permitiria que batesse em sua porta e levassem a sua dor tão conhecida, colocando uma ainda maior em si, com a qual não se acostumaria. Não aceitaria.

Ela se bloqueara, mais uma vez, pra mais um amor. Não deixaria nunca de sentir, não se arriscaria. Era covarde demais pra esperar que um desconhecido a levasse aonde sequer o antigo a levou. Era covarde por não mais acreditar. Ah, aquele amor truculento que queria deixá-la no apogeu da perplexidade, não a enganaria, não com este esteótipo de amor natural.
Poderia bater mil vezes na porta, que mil vezes ela seria fechada. Mil vezes com medo do desconhecido. Mil vezes se perdendo em seu limite de dizer não. Mil vezes achando que perder a emoção é melhor que perder a razão.
E continuaria assim, até que encontrasse alguém corajoso o suficiente, forte o suficiente pra tirá-la da cápsula que a protegia e a levasse de olhos fechados mesmo, sem medo, sem dor e leve, mas que simplesmente a levasse.

Um comentário:

Unknown disse...

amei !!! sem palavras... você é demais.